A***
Casimiro de Abreu
Falo a ti - doce virgem dos meus sonhos,
Visão dourada dum cismar tão puro,
Que sorrias por noites de vigília
Entre as rosas gentis do meu futuro.
Tu m'inspiraste, oh musa do silêncio,
Mimosa flor da lânguida saudade!
Por ti correu meu estro ardente e louco
Nos verdores febris da mocidade
Tu vinhas pelas horas das tristezas
Sobre o meu ombro debruçar-te a medo,
A dizer-me baixinho mil cantigas,
Como vozes sutis dalgum segredo!
Por ti eu me embarquei, cantando e rindo,
- Marinheiro de amor - no batel curvo,
Rasgando afouto em hinos d'esperança
As ondas verde-azuis dum mar que é turvo.
Por ti corri sedento atrás da glória;
Por ti queimei-me cedo em seus fulgores;
Queria de harmonia encher-te a vida,
Palmas na fronte - no regaço flores!
Tu, que foste a vestal dos sonhos d'ouro,
O anjo-tutelar dos meus anelos,
Estende sobre mim as asas brancas.
Desenrola os anéis dos teus cabelos!
Muito gelo, meu Deus, crestou-me as galas!
Muito vento do sul varreu-me as flores!
Ai de mim - se o relento de teus risos
Não molhasse o jardim dos meus amores!
Não t'esqueças de mim! Eu tenho o peito
De santas ilusões, de crenças cheio!
- Guarda os cantos do louco sertanejo
No leito virginal que tens no seio.
Podes ler o meu livro: - adoro a infância,
Deixo a esmola na enxerga do mendigo,
Creio em Deus, amo a pátria, e em noites lindas
Minh'alma - aberta em flor - sonha contigo.
Se entre as rosas das minhas - Primaveras -
Houver rosas gentis, de espinhos nuas;
Se o futuro atirar-me algumas palmas
As palmas do cantor - são todas tuas!
Agosto 20 – 1859.
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